A grande maioria dos automobilistas não tem a mínima noção do impacto que a velocidade tem na segurança rodoviária, essencialmente em meios urbanos, mais precisamente para os utilizadores vulneráveis como peões e ciclistas.
Farei essa demonstração física e matematicamente.
No ponto A o condutor do veículo que se deslocava a uma velocidade v e de massa m, apercebe-se que tem um obstáculo na sua frente, que o obrigará a efetuar uma travagem de emergência, ou a fundo. Todavia a reação não é instantânea, e apenas quando o veículo toca o ponto B, o condutor começa realmente a travar a fundo, havendo por conseguinte uma Força de atrito dinâmico Fa contrária à velocidade. O veículo só parará no ponto C, estando o peão/pedestre no ponto P.
Pela leis da mecânica clássica, sabemos que a velocidade é dada por
que significa que v será a distância entre os pontos A e B dividida sobre o tempo que decorreu entre esses mesmos dois pontos. Se considerarmos que o condutor do veículo tem um tempo de reação entre os pontos A e B de tr segundos, podemos reescrever
Pelas leis da mecânica clássica também sabemos que a Energia Cinética Ec do veículo no ponto B é
Ao ao longo do trajeto em que o veículo abranda, é exercida uma Força de atrito dinâmico Fa, pois existe uma força de fricção, que é contrária à velocidade do veículo. As forças de atrito dinâmico são praticamente independentes da velocidade. Adotamos por questões de simplificação, o caso em que as rodas literalmente bloqueiam. Na realidade, as rodas não bloqueiam totalmente através de sistemas de travagem como o ABS, mas ignoraremos para já tais sistemas por razões de simplificação.
A Força de atrito dinâmico Fa depende do coeficiente de atrito dinâmico µ dependendo também da força normal à superfície, ou seja, do peso do veículo, que neste caso é mg. Então
Do ponto B até ao ponto C, o trabalho Wa realizado pela Força de atrito dinâmico Fa será
Esse trabalho terá de anular a Energia Cinética Ec que o veículo possuía no ponto B. Logo obtemos a seguinte equação
concluindo que a distância de travagem total D será
Significa que a Distância de travagem total D tem uma componente que é linear com a velocidade e outra que depende de forma quadrática da velocidade.
Resumindo, a distância de travagem total de um veículo em função da velocidade é dada por
onde tr é o tempo de reação do condutor, µ é o coeficiente de atrito dinâmico entre os pneus e o pavimento e g é a aceleração da força da gravidade.
Esta distância depende linearmente com a velocidade e com o tempo de reação do condutor, e quadraticamente com a velocidade. Pouco importa a marca ou o peso do veículo. Matematicamente é claro que os fatores que unicamente são importantes são a velocidade; o tempo de reação do condutor, que por exemplo aumenta bastante com o sono ou com o álcool; e o coeficiente de atrito dinâmico µ que é fortemente afetado pela qualidade dos pneus, a meteorologia e a qualidade do pavimento.
Imagem da prof. Raquel Ribeiro |
Interessa agora tentar aferir qual é o valor do coeficiente de atrito dinâmico µ. Para tal iremos combinar a fórmula acima com alguns testes empíricos sobre distâncias de travagem, considerando que os testes realizados não têm em conta o tempo de reação do condutor. Usaram-se as seguintes experiências obtidas de uma revista da especialidade.
Assim, a fórmula fica
onde vk é a velocidade em km/h e D é a distância de travagem. Aplicando os valores obtidos para o teste efetuado com o Porsche Carrera, mas também para outros veículos mais comuns cujos testes a revista apresentava, obtemos a seguinte tabela.
Na seguinte imagem 3D, que compara a distância de travagem D (eixo vertical z), com o tempo de reação tr (eixo x, num intervalo entre meio segundo e 3 segundos) e a velocidade v (eixo y, num intervalo entre 0 e 50 km/h), pode-se constatar que quer a velocidade, quer o tempo de reação, tomam um papel muito importante na distância de travagem. O coeficiente de atrito dinâmico foi estabelecido em µ=0,9.
Distância de travagem em função da velocidade e tempo de reação D=z ; y=v=[0,50]km/h ; x=tr=[0.5,3] segundos ; µ=0,9 |
Já todavia no seguinte gráfico 3D que compara a distância de travagem D (eixo vertical z), com o coeficiente de atrito dinâmico µ (num intervalo entre 0.3 e 1) e a velocidade v (num intervalo entre 0 e 50 km/h), pode-se constatar que o estado do pavimento ou a qualidade dos pneus (µ), são fatores extremamente importantes na distância de travagem, mas essencialmente para velocidades mais elevadas. Repare-se que ao longo do plano v=20km/h a altura D=z pouca varia com a qualidade do pavimento e dos pneus (µ), mas ao longo do plano v=50km/h a qualidade dos pneus e do pavimento (µ) tomam um papel fulcral na distância de travagem (D).
Distância de travagem em função da velocidade e coeficiente de atrito dinâmico D=z ; v=[0,50]km/h ; µ=[0.3,1] ; tr=1s |
Conclusão
A distância de travagem varia substancialmente com a velocidade a partir de pequenas velocidades de cerca de 20 km/h. Considerando ainda que a Energia Cinética de um veículo varia com o quadrado da velocidade e é um dos fatores mais importantes para a fatalidade de utilizadores vulneráveis como peões ou ciclistas, o autor aconselha o legislador para que imponha sérios limites em termos de velocidade de veículos, essencialmente em meios com elevada densidade populacional, como zonas urbanas residenciais. É por isso essencial que as autoridades de prevenção rodoviária implementem medidas que melhorem consideravelmente a fiscalização das velocidades praticadas e medidas de acalmia de tráfego, nomeadamente o estabelecimento de zonas 30. A qualidade dos pneus e o do pavimento, tomam também um papel extremamente importante na distância de travagem, mas essencialmente para velocidades acima dos 30 km/h como pode ser constatado no último gráfico, o que enfatiza o facto, de ser deveras importante diminuir os limites de velocidade em meios onde existe elevada concentração de pessoas.
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